Onde trabalho o Guaíba
é a minha paisagem
Tem dias que esse rio
com sua mansa passagem
parece uma estrada azul
convidando a uma viagem
Se minha sala não tem
de Monet nenhuma tela
eu posso ver navegar
um suave barco a vela
que aparece de repente
na moldura da janela
No fim da tarde o sol
espraia a sua beleza
quando vem se contemplar
no espelho da natureza
e um poente mais bonito
não foi pintado em Veneza
Nossa capital cresceu
sugere a geografia
na banda leste do rio
só pra ver a poesia
dessa luz crepuscular
diferente a cada dia
É o pôr-do-sol no Guaíba
um momento especial
Eu não me canso de ver
no cenário fluvial
um matiz alaranjado
que nem parece real
Mas passou o rio do tempo
numa corrente furiosa
trazendo a degradação
de maneira vergonhosa
e a água que era doce
foi ficando amargosa
Quando ainda era limpo
naqueles tempos de antanho
as suas águas saudáveis
eram próprias para o banho
e a vazão de poluentes
foi um erro sem tamanho
Afluentes de detrito
nosso rio agora tem
Jacuí, Gravataí,
Sinos e Caí também
desembocam no Guaíba
os rejeitos que contém
Esgotos são o veneno
injetado em sua veia
Na vazante o rio fede
ficando escuro na cheia
e nas margens onde passa
devolve o lixo na areia
E esse lixo derramado
no seu curso caudaloso
vai deixando o pescador
cada vez mais mentiroso
o seu peixe mais escasso
e o povo mais saudoso
E devido a nosso rio
reter a cada momento
avalanches de sujeira
sem que haja escoamento
é chamado pelo povo
de esgoto ao relento
Diverso daqueles mares
que desde remotas datas
esconderam no seu leito
os tesouros dos piratas
nosso rio só acumula
pneus, garrafas e latas
Estudiosos discutem
se o Guaíba é rio ou lago
No campo da hidrologia
meu conhecimento é vago
Não aceito é que tenha
esse destino aziago
No entanto estamos vendo
que indústrias da capital
não resolveram problemas
de impacto ambiental
e a cidade está perdendo
o seu belo manancial
As águas são balneáveis
somente em Itapuã
As iniciativas são
Pró-Guaíba e Fepam
mas sem controle na fonte
toda esperança é vã
Um limpando e dez sujando
é agora um triste fato
Vamos ver se não houver
um controle imediato
se transformar o Guaíba
em um caldo putrefato
A cidade Porto Alegre
abraçada em sua curva
no caos da modernidade
deixa sua água turva
e diante do progresso
a capital se recurva
A cidade está matando
o seu primeiro amigo
Nosso rio está morrendo
sem merecer o castigo
e o curso das suas águas
é o seu próprio jazigo
As garças passam voando
serenas e elegantes
e descendo vão pousar
lá nos aguapés distantes
sem saber que o Guaíba
já não é mais como antes