A PREMONIÇÃO (de "Vozes do Aquém")

Pressinto um novo mundo,
onde todos têm os mesmos direitos e deveres,
sentados que estão à mesa do Senhor.

Posso ver claramente o pão sendo repartido
e a pouca importância que todos dão a isso,
tamanha a intensidade da beleza
tão facilmente disponível.
Quase posso tocar as milhares de luzes
que brilham e aquecem o caminho,
e enrosco os pés nos mantos aveludados
que guarnecem as chaves dos cofres
dos tesouros.

São visões que causariam náuseas em alguns,
já que há criaturas das mais diferentes,
reunidas com o firme propósito de dialogar.
A mistura de cheiros não me incomoda nem um pouco,
mas estranho alguns lugares vagos,
marcados por pequenas placas prateadas.

Sinto falta de muito mais gente.

O Paraíso está vazio,
o que é mal sinal.
Vou até a outra ponta
e toco o sino.
Não contente,
consulto o livro.

Descubro que há muito trabalho a fazer,
para arrumar a escada
e facilitar a chegada.
Peço uma caneta emprestada
e começo a trabalhar de imediato.

Quem sabe ainda hoje
os céus serão retomados?
Além da linha do Sol,
posso antecipar o túnel.
Desce um pouco antes de subir,
depois vira
e lança espetacularmente a alma
para o reino acolchoado
das nuvens.

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