O MIRANTE DO DESABROCH

Ao descerrar a janela do meu quarto,
Contemplo a paisagem do quintal de casa:
Compleição bucólica em que predomina
Uma atmosfera que cintila ao sol da manhã de crisálida.

Aqui, parece que a alvorada
Se despede mais cedo:
Entrega-se ao arrebate do fogo heliocêntrico
Quando o dia jaz ainda sob o aconchego do leito.

Passados alguns momentos de deslumbramento,
Acomodo um pouco meu olhar
Sobre a ventura da ótica
Que repousa na cama da urbana roça:

Meu par de olhos goza o contemplar
Das bananeiras, abacates, graviolas;
Mangas, mamões, limas, limões, laranjas, cenouras, abóboras;
Mandiocas, cocos, inhames, batatas-doces, acerolas!

No entanto, é o céu que me enleva e arrebata:
O albino azul que me afoga;
As nuvens pairando plácidas;
No ventre, posso vislumbrar a linha do horizonte e ás abóbadas agigantadas.

Afinal, ao regressar da dimensão do divagar,
Sinto-me como tivesse levitado
A bordo da nave do profundo pensar:
Agora, a poesia, em mim, eclode, recrudesce, é contínuo jorro de avatar!

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA

ÁGUAS (Jô)

Águas fortes, vigorosas,
Levando tudo por frente,
Afogando vidas,
Naufragando navios,
Conduzindo aos rios, os barcos.
Absortas por vezes em seu curso
De tempestades e ventos.
Apavorando marinheiros,
E os pescadores emergindo em sonhos.
Interrompendo também planos, com suas mortes.
Separando vidas.
Tudo arranca em sua força
E engole em seu seio fortalezas de ouro,
Ferro e bronze,
Dos navios náufragos,
Das gentes poderosas ou vis.
Causa espanto e horror
A imagem do desterro,
Resultado de seu poderio.
Admiráveis e respeitadas
As águas, que tudo arrancam.
Esquecem, porém os viandantes de considerar.
Os poetas de mencionar.
Os homens, de admirar as margens.
Compressas e vigorosas,
Impõem limites as molhadas águas.
Contêm a fúria de suas correntezas e ondas.
São tão mais poderosas as margens,
Em seu silêncio discreto e sóbrio.
Fica a contemplar o curso
Destas águas violentas ou serenas.
São as margens que dão curso ao seu desaguar,
Que determinam o seu caminhar.
Nada podem fazer as águas, nem mudar seu destino.
Submetem-se ao desenho de suas margens,
E mesmo ainda quando revoltosas sob o manto
Das cheias e enchentes,
se obrigam retornar ao seu nível normal.
As margens sim são violentas!
Levam as águas e as conduzem
Por onde querem.

Josias Souza (Jô)
[email protected]

Nós, selvagens.

Eu não irei sujar minhas mãos com o sangue do mundo, se o meu é que deveria ser derramado.
Não, não podem estar todos errados.
Eu não acredito que a minha consciência é a única correta.
Eu não posso crer que a consciência do mundo está condenada.
Nem sua destruição irá me convencer de que não existem pessoas que lutaram.
Animais não destroem o seu lar, mas fazem dele uma fortaleza.
Não tornem carepa a imagem dos bichos, se os inconscientes somos nós.
E enquanto ninguém bater na nossa cara, enquanto ninguém arrancar nossos olhos e apontar o dedo para o nosso nariz, vamos continuar chutando o traseiro da nossa morada.
Selvagens, somos nós.

A CHUVA

Branca a chuva despenca
E molha tudo:
Ave, avental, avenca,
Túnica, tule, toldo…

E como bola
Rua abaixo
Ela rola
Levando lixo.

Fura o teto,
Pula na cama;
Afoga um inseto
Na lama…

E quando se vai,
Em fuga amarílis,
Deixa no céu, ai,
Um belo arco-íris.

ELEGIA DE VERÃO

Numa tarde de verão
Morre a cigarra,
Agarrada, então,
Ao nó da taquara.

Fica triste o mundo.
Choram as formigas,
Que, apesar de tudo,
Eram suas amigas.

E no alto das galhas
Lamentam os pardais,
Os sabiás, as araras,
E outros pássaros mais,

Embora soubessem
Da brevidade da vida.
E ao chão todos descem:
É a hora da despedida.

Enterrada a cigarra,
Ao pé do ribeirão,
Um pergunta: – E agora,
Que será do verão?

A rosa e o poéta

Deus ordenou que a beleza
Se espalhasse pelo sobre o chão
E que fosse dado a todos
O prazer dessa visão.

A natureza de pronto
Misturou todas as cores
E cobriu a terra em flores
Colorindo a imensidão.

Superou-se a cada dia
Na beleza em criação
A natureza em serviço
Pra chegar a perfeição.

Fez tulipas, margaridas
Umas raras outras não
Muitos tipos, muitas cores
Perfumes sem dimensão.

Até que um dia a natureza
No auge da inspiração
Fez a rosa que encanta
Na beleza e na canção.

Deus sorriu agradecendo
A natureza que criou
Das belezas dessa terra
A mais bela que brotou.

Deus ainda insatisfeito
Quiz completa perfeição
Que o que encantasse os olhos
Atingisse o coração.

Pensou ele muito tempo
Pra encontrar a solução
E achou que era preciso
Recriar a criação.

Como um diamante bruto
Que arrancado do chão
Precisa ser lapidado
Pra chegar a perfeição.

Deus pegou o homem puro
E tocou-lhe o coração
Lapidou o que era bruto
E expandiu-lhe a emoção.

Deu-lhe sensibilidade
Pra descrever com palavras
A beleza e o sentimento
De tudo que vislumbrava.

Como a rosa encanta os olhos
E nos mostra a perfeição
Deus criou o poeta
Pra encantar o coração.

VIDA

O dia amanhece
Com brisa suave,
E o sol aparece
Tão lindo a brilhar.
Sigo meu caminho,
Criança sorrindo,
Alegre e sentindo
Pureza no ar.
Me sinto inspirada,
Fico apaixonada,
Quisera criar,
Um verso bonito,
Singelo e conciso
E fantasiar.
Por isso é que digo:
A vida é magia,
Magia é poesia,
Poesia é amar.